O medo nas organizações

Existe medo nas empresas: há o focado numa pessoa, normalmente no chefe; e há aquele institucionalizado, que é o temor genérico do desemprego. Não estamos falando de respeito, mas sim de medo, propriamente dito.

Meu novo chefe era um expatriado, novo de Brasil.  No passado havia chegado ao posto de capitão num dos exércitos mais poderosos do planeta. Chegou com uma vitalidade impressionante. Do alto dos seus quase dois metros de altura, era jovial, caloroso, aberto e especialmente decidido a falar com todo mundo.  Ele convocava reuniões com os diretores, os gerentes, os supervisores e quem mais achasse interessante. Isso impactou duramente a hierarquia, mas a maioria estava deliciada com a sua postura, principalmente porque o antigo gerente-geral era muito fechado e disciplinado. A organização só não descambou para um estado de muita desorganização porque as pessoas tinham a hierarquia enraizada no seu comportamento.

Algumas semanas depois o chefe me perguntou como estava sendo visto pelo pessoal.  Eu disse que todos estavam gostando muito dele, estavam bastante motivados, e surpresos pela possibilidade de falar diretamente com o gerente-geral.  Mas, completei dizendo que todos ainda tinham um pouco de medo dele.  Ele perguntou: “Muito medo ou um pouco de medo?”  Eu respondi: “Um pouco.” e ele concluiu: “Um pouco de medo é bom.”

Medo é bom por quê?

Pode-se dizer que um pouco de medo é bom, porque leva à obediência rápida, à disciplina, à conformidade e ao foco na tarefa.  Sentir medo de um chefe é algo muito comum nas empresas. É assim, por exemplo, no exército, a mais burocrática das organizações.

Por outro lado, o medo é ruim, porque inibe os questionamentos, limita a criatividade, dificulta a visão do todo e restringe o foco no processo ou na tarefa.  Também não incentiva o trabalho em equipe, pois cada um fica primariamente preocupado com a própria carreira e sobrevivência. Em excesso, o medo pode ter efeitos físicos, como tiques nervosos e dificuldade até de falar com a pessoa que o provoca. Quem já não sentiu medo de um chefe? 

O medo, porém, é um atributo da própria autoridade, pois esta não pode ser exercida sem que disponha de um componente de premiação ou de castigo.  A autoridade pode ser comparada à lei, que é inócua se não houver uma pena que corresponda à sua inobservância. Como diz o ditado jurídico: “Não há lei sem pena”.  Portanto, o medo é parte da autoridade e intrínseco à estrutura burocrática.   Este fato pode ser disfarçado, principalmente em organizações muito grandes e descentralizadas, mas continua lá.

De onde vem o medo?

O medo do chefe provavelmente está ligado ao poder que ele tem sobre o nosso destino na empresa, ou seja, o poder de nos manter, promover ou demitir. Esse medo pode aumentar ou diminuir em função da personalidade do chefe e da maior ou menor maturidade do relacionamento entre ele a sua equipe.

O medo também pode advir da precarização do emprego no mundo atual.

A tecnologia, a automação, a continua revisão de formas mais eficientes (e econômicas) de se chegar a resultados, aumentam as pressões por produtividade, provocam reduções de quadro e aumentam a carga de trabalho dos sobreviventes.

Além disso, a precarização do emprego formal em função de contratos temporários, redução de jornada e terceirização de serviços, aumenta a percepção de risco do desemprego, associado à incerteza de como e quando se dará o retorno ao trabalho.  Os próprios modelos organizacionais montados em forma de redes, hubs, matrizes de processos, etc., são mais fáceis de serem dissolvidos ou redefinidos do que as antigas estruturas piramidais da burocracia clássica.

A possibilidade constante de demissão – mesmo quando não há sinais de uma crise no horizonte – leva a uma incerteza permanente, ao conformismo e a uma entrega total à tarefa.

Ao medo do chefe, portanto, soma-se o medo institucional, que afeta todos os níveis hierárquicos, dos operacionais aos diretivos.   Este é um drama do mundo moderno, e que deverá permanecer afetado pela contínua competitividade e pela aplicação de tecnologias disruptivas em relação ao emprego.  Não tem soluções simples.

Neste sentido, este artigo limita-se a levantar o assunto para uma reflexão. No máximo, podemos observar que deverão continuar a ter mais segurança os melhor preparados e os mais eficientes. Ah, e parece que as mulheres sentem menos medo do que os homens!

Um abraço a todos.

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