Cadeiras quentes

A alta rotatividade numa posição pode ter diversas causas, mas entre elas, a competência dos profissionais normalmente não é a mais significativa.

Quem já não se sentou numa cadeira quente, ou conheceu pessoas que assumiram turnos num desses incômodos assentos, ou soube de algum lugar onde essa peça de mobília era tão desconfortável que ninguém ficava ali por muito tempo?

Pois é, conhecemos vários executivos que tiveram a experiência de terem sido o terceiro, ou o quarto, ou o quinto ocupante de uma determinada posição num curto espaço de tempo, algo assim como em dois ou três anos! E nesses casos a alta rotatividade não era generalizada, mas se referia a uma posição específica na organização.

Enquanto a troca constante de ocupantes indica problemas organizacionais, o próprio profissional precisa avaliar bem a situação antes de aceitar um desafio com essas características.

No que deve atentar o profissional

Sabedor de que a posição tem tido vários ocupantes, o profissional precisa ficar atento a eventuais sinais de alerta recebidos ao longo do processo seletivo.

O recrutador pode dizer que “A vaga é difícil”; que a empresa “não está conseguindo achar o candidato certo”; que o profissional precisa ser “resiliente e capaz de lidar com resistências”, que “vários profissionais não conseguiram permanecer na função por muito tempo” e outras frases dessa natureza. Esse tipo de comentários pode indicar uma “cadeira quente”, e nestes casos o sucesso do ocupante não dependerá necessariamente da sua competência profissional.

É melhor explorar a questão bem a fundo. Além disso, em entrevistas subsequentes, o próprio dono da vaga pode dizer que as contratações anteriores foram de gente “muito nova”, “muito ingênua”, “muito ambiciosa”, “muito fraca”, etc.

Também pode dizer que a equipe da área é briosa e leal, que são marinheiros de primeira hora, que têm o seu respeito, e que há pessoas na equipe que estão quase prontas para ocupar a posição. Também pode adiantar que um determinado cliente interno da área tem reclamado muito da qualidade da entrega e até reivindicou que a área fosse colocada sob o seu comando.

Se esse tipo de atitude ocorrer, é importante que o candidato consiga vislumbrar se o dono da vaga é parte do problema ou da solução. E precisará sentir se o futuro chefe é alguém que tem posições dogmáticas (forma leve de dizer que se julga dono da verdade), se o seu raciocínio é lógico e fácil de ser acompanhado, se suas expectativas são razoáveis.

E, principalmente, se ele demonstra reconhecer que a alta rotatividade aponta para a existência de um problema na organização e não apenas nos profissionais.

Em suma, o candidato deve procurar verificar se além das pressões da equipe e de outros setores da empresa, a posição também não receberá pressões extraordinárias de cima para baixo! E evitar tomar uma decisão com base na lógica do “Comigo será diferente.”

O que cabe à empresa?

A existência de uma “cadeira quente” na empresa pode efetivamente indicar problemas na gestão. Uma das dificuldades de resolvê-los é que em geral eles são causados ou permitidos por alguém de alto nível hierárquico e de muita autoridade, o que exige muita habilidade no trato do assunto.

Mas chegar a isso é essencial, pois, como em qualquer desvio comportamental, uma solução se inicia no reconhecimento de que o desvio existe.

Não temos receitas prontas para chegar a esse ponto (quem dera!), mas entre elas poderiam estar, por exemplo, uma avaliação franca feita por conselheiros ou consultores independentes; ou a participação do administrador num seminário de alto nível em que ocorra um “insight”; ou por obras do acaso, tais como a leitura de um livro ou artigo inspirador. Evidentemente, há também lições que podem ser aprendidas pela dor, tais como resultados muito negativos para o negócio.

Em suma, uma alta rotatividade é danosa e custosa, além de desfalcar uma área de uma liderança que deveria estar produzindo resultados. A disfunção pode estar sendo causada pelo próprio dono da vaga; por expectativas irrealistas para o cargo; por equipes resistentes que têm o ouvido do dono; pelo boicote imposto por outra área da empresa; ou até pela presunção da organização de que qualquer novo ocupante não durará muito tempo na função. E, com certeza, entre as causas centrais do problema não estará o nível de competência dos profissionais que passaram pela posição.

Trata-se, enfim, de uma situação em que todos perdem e que precisa de uma solução. Não está certo o professor que diz com orgulho que reprovou 80 % dos alunos.

Um abraço a todos e cuidem-se bem!

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